quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

OS ENIGMAS - Karl Jaspers



























"Não é possível conciliar Deus e Auschwitz o havia percebido Jó. O Antigo Testamento atinge culminâncias de verdade ao dizer que Deus se transforma para os homens e deles se aparta quando estes reconhecem sua revelação e suas promessas — e continua a ser Deus".(Jaspers)




1. Um dos mais perturbadores enigmas da religião bíblica é o que se refere à presença material de Jeová transmitindo o Decálogo a Moisés e ao povo de Israel: E todo o povo viu os trovões e os relâmpagos e o som da trompa e o monte fumegando; e o povo, vendo isso, retirou-se e pôs-se longe. E disseram a Moisés: fala tu conosco e ouviremos; e não fale Deus conosco, para que não morramos.
E disse Moisés ao povo: não temais, pois Deus veio para provar-vos e para que seu temor esteja diante de vós, para que não pequeis. E o povo estava em pé, de longe; Moisés, porém, se chegou à escuridão onde Deus estava (Êx. XX, 18-21). O povo outorgou um mandato a Moisés. Submeteu-se à sua autoridade, à revelação dos Dez Mandamentos que a Moisés havia sido feita. E tal submissão não fez o povo escravo.
Escravos os hebreus haviam sido no Egito. Jeová os tinha libertado e feito sair da casa da servidão. E agora pedia a esses homens livres aquilo que lhes traria a liberdade interior:
Não terás outros deuses diante de mim.
Não farás para ti imagens de escultura... não te prosternarás diante delas.
Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão.
Honrarás pai e mãe.
Não matarás.
Não cometerás adultério.
Não furtarás.
Não darás falso testemunho contra o teu próximo.

Que encontramos no Decálogo?

O Deus único: ele é o espelho da força que empresta coesão a nossa vida. Para o homem naturalnós todos — o politeísmo é urna segunda natureza. Os deuses entram em conflito. É impossível conciliar as exigências que nos fazem. O homem é o ser que se contradiz. Servindo a alguns deuses, ofende outros. Então, com surpreendente energia, afirma-se o poder do Único. ele repele o simplesmente natural. E desperta no homem uma vontade de outra origem. Não farás para ti imagens de escultura: a Transcendência deixa de ser Transcendência quando aprisionada em imagens. lhe compreendemos a linguagem quando assume forma de enigma. Ela própria se coloca para além de todos os enigmas. Tal a verdade da reflexão filosófica.
Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão: o homem circunspeto não graceja com o nome de Deus. Não faz apelo a Deus quando deseja algo para si, neste mundo. Tomar o nome de Deus em vão equivale a invocar o favor de Deus contra os outros.
Honrar pai e mãe, não matar, não cometer adultério, não dar falso testemunho: tais são as simples, grandes e indispensáveis condições de uma vida comum vivida em confiança.
qualquer coisa de estranho nos acontecimentos do Sinai: o mandamento proíbe as imagens esculpidas e, portanto, nega a materialização de Deus. Quando, à sombra da nuvem, Moisés atravessa a montanha, os fenômenos vulcânicos constituem uma experiência concreta, à semelhança da proclamação dos Dez Mandamentos, que é feita em seguidamas Deus não se materializa. Não assume forma. O povo não o , nem pode ouvi-lo.
Os Dez Mandamentos foram encarados com leviandade, sob o pretexto de serem óbvios. Não obstante é tão difícil observá-los que, por certo, homem algum o consegue de maneira perfeita. Fossem eles obedecidos, e não viveríamos num estado de engano (tanto em negócios públicos quanto em negócios privados) que encaramos como inevitável, mas teríamos uma comunidade autêntica e digna de confiança. “A moral é evidente”, diz um adágio mentiroso. Evidente, muito ao contrário, é que reduzimos a moral ao silêncio.
Maravilha de simplicidade, clareza e profundidade para todos os tempos, o conteúdo dos Dez Mandamentos é. de uma só vez, revelado e capaz de convencer o homem enquanto homem. Falam à conveniência, através da razão. Levantam-se por sobre a paixão, a violência, o instinto, o capricho. Dando-lhes obediência, o homem concretiza sua liberdade existencial.
Formulando seu imperativo categórico, Kant bem compreendeu a exigência de que a consciência se faz objeto: age como se, com tua ação, estivesses criando um mundo onde o teu princípio de agir pudesse ser válido para todos e para sempre.
A consciência é a dimensão onde cessa a soberania do sujeito, não por submissão a uma ordem exterior e incompreendida, mas por livre obediência ao próprio entendimento.
Esse poder que compele sem exercitar violência e que, obedecido, parece brotar de mim mesmo é tão discreto e desmaiado que aparentemente se desvanece na realidade.
Não obstante, o que se encerra em minha consciência é mais do que eu mesmo. E esse “mais” fala através do enigma que, certa vez, tão profundamente marcou o homem no acontecimento do Sinai. Quem poderia esquecer o Sinai, após a leitura da narração bíblica? Perceber a importância do homem ancorada no fundamento das coisas, ancorada no próprio Deus como enigma, revigora a consciência. E a mensagem permanece mesmo após desaparecida a presença.
2. O Sinai é um exemplo de enigma. A ciência das religiões e dos mitos reúne os enigmas. Classifica-os em gêneros. Mostra-nos a transformação dos deuses. Jeová, o Deus da Guerra do Cântico de Débora, não é o Deus diante do qual Jó formula queixas, nem é o Deus a quem Jesus se dirige.
Sobre o pano de fundo das comparações universais projetam-se as figuras do passado, sempre únicas: a par das que aparecem na Bíblia, há o panteão grego e as mitologias hindu, chinesa e escandinava.
A semelhança das línguas, os enigmas nos chegam por tradição. Não os inventamos; apropriamo-nos deles.
Eis alguns outros exemplos:
a) Desde o período sumeriano (quarto milênio a. C.) têm sido elaboradas cosmologias. A ordem da vida humana é reflexo da ordem das estrelas no ciclo imutável de seu eterno movimento. As invioláveis leis celestes são válidas para a existência humana, sempre em colapso e sempre em reconstituição. Os eventos humanos são eventos cósmicos.
Os enigmas prolongam-se pela História. Kant pôde ainda exclamar: “duas coisas enchem o espírito de admiração e de respeito — o céu estrelado acima de mim e a lei moral em meu interior... associo-as diretamente à consciência de meu próprio existir”.
b) É insustentável a idéia de um mundo divino, uno e integralmente racional. O mundo se apóia no caos. Do caos brotam o mundo e os deuses, que o limitam, mas não ultrapassam. O caos lhes deu vida, o caos os devorará.
O enigma de um Deus injusto e impiedoso, que faz o sol brilhar indiferentemente para os bons e para os maus. torna-se, na Gnose antiga, o enigma de um criador sem mercê. O mundo em que vivemos é despido de amor, caótico, irracional, de brilho enganador. Nós, com nossas almas capazes de amor e de razão, somos centelhas de luz lançadas ao mundo por nefasto destino. Aspiramos a deixar este mundo para nos reunirmos a um Deus longínquo, ao Deus do amor que, entretanto, a ninguém pode socorrer neste mundo.
c) O panteão grego é único na História, infinito e maravilhosamente claro. Nele, tudo quanto existe, tudo quanto é permitido ou ordenado, tudo que o homem pode ser se oferece a nós através de divinos enigmas.
Na mitologia grega, o Monte Olimpo é a morada dos Doze Deuses do Olimpo, os principais deuses do panteão grego. Os gregos o pensavam como uma mansão de cristais que estes deuses (como Zeus) - habitavam.

Zeus: o Único, rei dos deuses, ao qual todos os deuses devem submeter-se, mesmo quando se rebelam, mas que está, por sua vez, submetido à Moira, ao Destino impessoal a que não se clama, nem se ora. Em seguida, Apoio, o deus distante de tudo quanto é vulgar, impuro, mórbido, falso. Não se trata de uma força da natureza. Isento de paixões, Apoio vive na pureza e na dignidade. Deus vigoroso, jovem, belo, intangível, ele brilha, destrói, repele e protege. Exige medidas e formas. Seus mandamentos dizem: Moderação, conhece-te a ti mesmo, tem consciência de que és um homem. Sócrates, o filósofo, deu-lhe ouvidos. ele está longe de ser o deus único, senhor da existência. Ao contrário, permanece afastado da vida perturbada, sofrida e confusa. Age sobre esta vida, mas com ela não se compromete. A seguir, Afrodite, deusa nobre, que enobrece o amor sexual. E todos os outros deuses, Atenas, Hera, Ártemis, os deuses olímpicos, os deuses da natureza, as náiades, as ninfas, as driades. Inesgotável coleção de nomes e figuras! Todas as possibilidades e todos os fados do homem, todas as depravações e todas as singularidades humanas  — tudo era divinizado. Aceitando tudo, limitava-se tudo, e tudo se punha em questão.
Zeus

Somente durante breve período foram esses deuses realidade. Os gregos atingiram seu apogeu enquanto homens: igualavam-se aos deuses. Enfrentavam-nos abertamente e faziam-nos manifestarem-se não através de teólogos e sacerdotes, mas através de poetas e filósofos. Viam-se no espelho dos deuses. Pouco depois, tudo desceu a uma lembrança despida de realidade, salvo para os humanistas que visam ao prazer estético.
Não podemos transformar-nos em gregos. Mas ficaremos empobrecidos se ignorarmos os deuses gregos e não os tivermos na conta de marcos significativos.
3. Talvez que hoje em dia os enigmas estejam entre as coisas que mais urgentemente dizem respeito à origem e destino de nossa liberdade.
a) Consciente de sua liberdade, o homem sente ser èle próprio. Nos grandes momentos, faz opções. Não obstante, pode falhar na tarefa de fazer-se ele mesmo e, então, não sabe o que verdadeiramente quer, sucumbe ao arbitrário e à perplexidade. Perdido nessa ausência de si mesmo, torna-se consciente de que pode recuperar-se pela via da liberdade.
É, contudo, abstrata a transcendência pela qual ele se sabe oferecido a si mesmo. Quando o homem, no gozo de sua liberdade, experimenta a Transcendência, necessita dos enigmas para elucidá-la.
b) Vimos quais eram, para o mundo, as conseqüências das manifestações da liberdade. Entusiasmados pela idéia de liberdade, verificamos que essas conseqüências nos colocam no caminho da catástrofe.
Se parece impossível tomar a via da liberdade, resta-nos a certeza de que essa trilha, embora aparentemente impraticável, é-nos imposta por dever e corresponde a nossa humanidade. Tal certeza a respeito de nosso destino estimula-nos a enfrentar a tarefa. O fato de não nos sabermos capazes de realizá-la associa à tarefa uma incerteza que não podemos evitar.
Então, os enigmas nos falam. Mostram-nos que não podemos dispensar um apoio brotado do fundo das coisas, apoio de que jamais temos consciência e com que jamais podemos efetivamente contar. É em tal apoio que nos fiamos, quando nos fiamos em nós mesmos. Esperamos que ele não nos falte, na medida em que, com amor e verdade, fazemos o que está a nosso alcance para nos sentirmos dignos de nossa liberdade. Não temos a certeza de poder contar com o auxílio aguardado, mas os enigmas encorajam nossa esperança.
c) Nossa identidade mostra-se ambígua: podemos dar-nos a nós mesmos na liberdade, mas podemos também falhar na tarefa de nos construirmos a nós próprios. A concretização de nossa liberdade mostrou-se equívoca: aparece como um ímpeto que pode, entretanto, conduzir-nos à ruína. E é ambígua também nossa posição no mundo: estamos à vontade ou nos sentimos estranhos a ele?
Parece que não fazemos senão desempenhar papéis. E, sem embargo, no plano da História, identificamo-nos a esses papéis. Ao mesmo tempo, somos e não somos esses papéis.
Quando, em tais papéis, nos sentimos nós mesmos, o mundo se transforma, por assim dizer, em nossa casa, como se, embora originários de outras paragens, nele encontrássemos abrigo.
Contudo, se, nos papéis, não nos sentimos nós mesmos, este mundo não é nosso mundo. Só nos cabe esperar o pior. E, então, embora tenhamos preservado a certeza de nossas origens, é como se, tendo abandonado a pátria distante, chegássemos a este mundo estranho.
Quando nos tornamos — o mundo em sua realidade e nós em nossa origem eterna — estranhos e desajustados, sentimo-nos sacrificados, privados de realidade e fé, com uma liberdade que se despe de sentido.
Teríamos, talvez, caminhado da estranheza de nossas origens para a estranheza deste mundo, sem sermos coisa alguma? A circunstância de podermos desesperar de situações que põem diante de nós enigmas dessa ordem já é uma indicação: quem se pode desesperar não é um nada; pode reencontrar-se.
Vemos nos enigmas a linguagem de todas as coisas, talvez ambígua e fluida, mas proclamando que o fim não é necessariamente o desespero.
Não dispomos, contudo, de qualquer garantia.
4. Falamos de enigmas. Que significa essa palavra? De onde a colhemos?
Da cisão sujeito-objeto resultam representações, conteúdos de pensamento, imagens — que não se limitam a ser apenas isso, mas encerram significação.
Tal significação não é a dos símbolos. Objetivamente falando, uma coisa pode ser indicativa de outra, como o é, por exemplo, a marca de fábrica de uma mercadoria, uma abreviação etc. A significação de que falamos existe, entretanto, sem que exista o objeto significado. As significações que não podem ser reduzidas ao objeto significado são por nós denominadas enigmas. Significam sem significar algo específico. Esse algo reside no próprio enigma e não existe fora dele.
Vivemos num mundo de enigma, onde o que é autêntico deveria revelar-se a nós, mas não se revela e permanece oculto na interminável variação das significações.
Os enigmas constituem, por assim dizer, uma linguagem da Transcendência, que de lá nos chega como linguagem de nossa própria criação. Os enigmas são objetivos; neles, o homem percebe alguma coisa que lhe vem ao encontro. Os enigmas são subjetivos: o homem os cria em função de suas concepções, modo de pensar e poder de entendimento. Na cisão sujeito-objeto, os enigmas são, a um tempo, objetivos e subjetivos.
5. Para muitas religiões, os deuses estavam fisicamente presentes neste mundo. Para a fé cristã, o Deus transcendente se fêz homem. Teve morte horrível e ressurreição gloriosa. Um só homem, Jesus, voltou de entre os mortos e é o Cristo ressuscitado. Os que nisso crêem, vêem nisso um acontecimento histórico, suscetível de localização no tempo e no espaço.
Surpreendemo-nos: ressuscitado na carne? Não é possível, pois um cadáver não recupera vida. Mas não se atesta que o fato ocorreu? A tumba esvaziou-se e o Ressuscitado apareceu a discípulos e discípulas. Ocorre apenas que os testemunhos só atestam a fé dos discípulos e não a realidade do conteúdo de tal fé.
Esse é o cerne da questão: não se pode resguardar a corporeidade da Transcendência no mundo.
As ciências contestam a corporeidade da Transcendência, porque a corporeidade é realidade e a realidade é objeto de ciência e não de fé.
Aquilo de que a ciência nos priva — a corporeidade da Transcendência — fica para nós preservado no domínio dos enigmas.
Os latos são universalmente válidos. Os enigmas têm existência histórica em um mundo empíreo e só falam a essa mesma existência. Os fatos são investigados. Os enigmas são penetrados pela imaginação e pela especulação.
Os fatos são incontestáveis. Os enigmas iluminam o caminho de nossa liberdade.
Crianças no campo de concentração de Auschwitz
As realidades são indiscutíveis: é assim e assim é. Os enigmas não nos propiciam solo firme, pois têm mais de uma face. O enigma “Deus” tomado de maneira direta, dá-nos sentimento de segurança. Contudo, faz-se ambíguo em razão de experiências que temos neste mundo e que não podemos descartar sem nos negarmos a nós mesmos. Não é possível conciliar Deus e Auschwitz. o havia percebido Jó. O Antigo Testamento atinge culminâncias de verdade ao dizer que Deus se transforma para os homens e deles se aparta quando estes reconhecem sua revelação e suas promessas — e continua a ser Deus. Mas esse Deus não é mais o Deus anterior. A palavra “Deus” destina-se a designar algo que nós, pura e simplesmente, não chegamos a compreender. O israelita do Antigo Testamento procurou, sem êxito, esclarecer o sentido dessa palavra; mas jamais duvidou de que Deus exista.

Por isso mesmo, a nós, homens, só nos resta escutar uma linguagem de enigmas na qual está incluído o enigma “Deus”, nela enxergando linguagem de significações múltiplas. Quando os enigmas se tornam inaudíveis, tudo se faz escuro e desolado em torno de nós. Quando os ouvimos, não achamos tranqüilidade.
6. O mundo bíblico e o mundo grego são premissas históricas. Não podemos negá-las. Deixar de negá-las implica, entretanto, em alterarmos radicalmente nossa maneira de encarar a Bíblia e a tradição. Essa alteração, que é uma viravolta, envolve os três pontos seguintes:
Primeiro: Devemos renunciar a emprestar corporeidade a Deus e à Transcendência. Jamais será possível identificar a Transcendência ao que quer que seja existente no tempo o no espaço. Ela se perde numa Transcendência imanente de que não temos conceito e na qual tudo quanto existe é divino.
Segundo: Em vez de nos preocuparmos com a corporeidade, importa darmos ouvidos aos enigmas da Transcendência que (não sabemos de antemão quais, quando, nem como) nos falam, nos perturbam e nos sustentam. A linguagem dos enigmas é concreta, mas não o é a Transcendência.
Terceiro: Os enigmas são múltiplos; correspondem a possibilidades de aceitação ou rejeição, de proximidade ou afastamento. Estabelecimento de relação com os enigmas evidencia que eles entram em conflito uns com os outros. A variedade dos enigmas ambíguos toma o lugar da base sólida de uma fé.
7. Tudo — realidades, pensamento, fantasia — pode constituir um enigma. Os enigmas diferem entre si até o ponto de se fazerem únicos. Os enigmas da beleza e da vida natural são inofensivos. O politeísmo, enigma da multiplicidade de poderes, desagrega. O Deus único aproxima. A Transcendência de todos os enigmas traz a liberação.
Não há sistema racional capaz de apreender os enigmas, nem ordem dialética em condições de lhes dominar os conflitos. A atividade filosófica, matriz dos enigmas, tem meios de dar expressão a nossas relações existenciais para com eles. É o que vem ocorrendo desde Platão.
O que foi outrora corporeidade dos deuses tornou-se enigma. A  clara luz dos enigmas temos a possibilidade de encontrar nosso caminho, o caminho dos picos inacessíveis. O conhecimento de uma infinidade de mitos não nos instrui a respeito deles. E as interpretações psicológicas degradam. a experiência existencial desvenda o significado dos enigmas.
Em nossos dias, caberia cogitar de uma tarefa de caráter filosófico, mas semelhante à teologia: o desvendamento filosófico das relações de cada um de nós para com os enigmas. Esse estudo os focalizaria em meio a seus conflitos E transformaria em presente o que foi passado. A teologia, entretanto, é dogmática e se funda em crenças; a metafísica dos enigmas seria um mundo de contornos fluidos, fundado na totalidade. A teologia é a dogmática da Igreja; a metafísica dos enigmas leria por base a responsabilidade de cada filósofo (que não se funda em autoridade alheia), dentro do quadro de três milênios de filosofia. A teologia une os crentes numa comunidade institucional; a metafísica dos enigmas viveria com a humanidade e com cada qual dos indivíduos.
Bibliografia
 JASPERS, K. Introdução ao pensamento filosófico. São Paulo: Cultrix, 1971.